sábado, 20 de setembro de 2008

"Incoerências"

Na incoerência
da palavra
espelha-se o desalinho
do espírito
em reveses
de sentidos,
contraditórios,
na apatia
em um vazio,
cheio,
de mim,
de um nada,
todo...
Na incoerência
da palavra,
palavras soltas,
vagabundas
na liberdade
do pensar,
palavras tão somente...

AV

"Liberdade"

Algures,
em um tempo
que não lembro,
me cortaram
as guias,
me tolheram as asas...
Remendei-as
com palavras,
fiz da escrita
céu
e,
assim,
tornei a voar...
Livre
de tudo,
de mais ainda,
e livre,
até,
de mim...

AV

"Pecado"

Tempos houve em que,
no fascínio dos deuses,
julguei encontrar redenção,
que na ilusão,
pela roda do tempo gerada,
sufocaria a angustia passada
e que nos braços de Orphéu
teria, para mim,
o amor a Eurídice destinado,
 que no carro de fogo de Apolo
teria meu transporte,
minha escada para o trono
no Olimpo da utopia...
Sonhei ser Vénus
em alguma paixão...
Por tudo isto me afundei
no pecado torpe
e cruel foi minha sentença
que a uma acutilante solidão,
em horas insanas,
me perpetuou...


AV

"Mulher"

Sou reino de ternura,
fonte de vida,
sou mulher...
Fruto outrora gerado,
semente que irá gerar,
sou terra,
fértil,
onde se dá o trigo,
fonte,
de amor,
permanente
sou primavera,
flor,
botão de rosa
a desabrochar,
coração
sempre pronto
a amar,
sou pássaro,
livre,
voando
em céu aberto,
sopro de calor
quando,
de ti,
estou perto
sou feita
de várias côres
e padrões,
mãe da humanidade
em todos os tempos,
esperança renascida,
dona dos ventos...
Sou confiança
no futuro,
bocadinho de luz
em mundo escuro,
pecado desejado,
teu desejo,
bem aventurado,
sou deusa,
por ti,
venerada,
tua sereia
talvez...
Sou raio
de sol
em cada família,
um oásis
no deserto
do teu desespero,
tábua de salvação
em meio
á tempestade
dos teus sentimentos,
sou estrela,
de luz radiosa,
em todos os firmamentos,
talvez que
teu destino seja
seguir meu olhar
para que
enfim possas
aprender a amar
mas,
concluindo,
dir-te-ei apenas...
Sou reino de ternura,
fonte de vida,
sou mulher...

AV


"Procuro-me..."

Perdi-me,
procuro-me...
Se me virem
dêem-me novas de mim,
de quem fui,
e hoje sou,
do que fiz,
do que hoje faço...
Digam-me se sou,
ou fui,
feliz,
se,
em algum momento,
amei
ou fui amada...
Perdi-me
e não me encontro,
não mais sei
quem sou,
fui,
ou serei...
Se me virem
dêem-me novas de mim,
e apenas digam
que me busco
para que,
de novo,
me encontre...

AV

"Espero-te..."

Na madrugada,
por lágrimas lavada,
lavo,
nelas,
também,
as manchas de dôr
no silêncio quebrado
de um momento...
Crio espirais,
ilusórias,
no vazio negro
esperando,
ansiando,
o raiar do dia,
novas da vida,
a luz do sol,
o canto matutino
do rouxinol
no plátano vizinho
e espero-te...
Espero-nos...
No reencontro
das palavras
deixadas por dizer...

AV

"Insónia"

Oca...
Vazia de mim
nesta infinda madrugada,
em busca
da palavra
rendilhada de sentidos,
sem sentido,
numa dispersão
de pensamentos
fugídios...
Escorro,
por entre os dedos,
as horas
de insónia,
intermináveis,
os segundos,
eternos moribundos,
do presente
já passado
e não vislumbro,
sequer,
um futuro imediato...

AV